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13/01/23

A inaplicabilidade do filtro da relevância do Superior Tribunal de Justiça diante da necessidade de regulamentação

O Pleno do Superior Tribunal de Justiça aprovou, em 19 de outubro de 2022, o Enunciado Administrativo nº 8, definindo que “a indicação, no recurso especial, dos fundamentos de relevância da questão de direito federal infraconstitucional somente será exigida em recursos interpostos contra acórdãos publicados após a data de entrada em vigor da lei regulamentadora prevista no artigo 105, parágrafo 2º, da Constituição Federal”.

Isso se dá em um contexto em que, após a publicação da Emenda Constitucional nº 125/2022 no Diário Oficial da União, em 15 de julho de 2022, que inseriu na Constituição Federal de 1988 os parágrafos 2º e 3º, do artigo 105, surgiu-se uma insegurança jurídica acerca da imediatidade da aplicação da relevância como requisito de admissibilidade, já que, de um lado, o § 2º do art. 105 da CF/88 utiliza-se da expressão “nos termos da lei”, fazendo referência à necessidade de norma regulamentadora específica, enquanto, de outro, o artigo 1º da mencionada Emenda estabelece que “a relevância de que trata o § 2º do art. 105 da Constituição Federal será exigida nos recursos especiais interpostos após a entrada em vigor desta Emenda Constitucional, ocasião em que a parte poderá atualizar o valor da causa para os fins de que trata o inciso III do § 3º do referido artigo”. Ao menos em tese, pela leitura deste último dispositivo, desde a publicação da Emenda
Constitucional, quando a alteração constitucional entrou em vigor, os operadores do direito estariam obrigados a demonstrar que as questões de direito federal trazidas recurso especial possuem relevância para que este pudesse ser apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça.

Para além disto, não se olvida que algumas recentes decisões monocráticas do STJ, em paralelo, vinham estabelecendo que se o acórdão recorrido fosse publicado em data anterior à data da publicação da EC nº 125/2022, não seria exigido o requisito da relevância para análise de admissibilidade do recurso especial[1], o que também sugere que a relevância passa a ser exigida imediatamente como requisito de admissibilidade aos casos cuja publicação do acórdão for posterior à entrada em vigor da EC.

O Enunciado põe fim à discussão e ratifica o que nos parece mais adequado: a criação de uma norma regulamentadora tendo em vista a eficácia limitada dos novos dispositivos inseridos pela EC nº 125/2022. Vale destacar que o Supremo Tribunal Federal tomou rumo
semelhante quando da publicação da Emenda Constitucional nº 45/2004, com a criação da Lei nº 11.418/06 que introduziu no CPC/73 os dispositivos que regulamentam o § 3º do art. 102 da Constituição Federal, quanto à exigência do requisito da repercussão geral
no recurso extraordinário.

Nos próximos meses, o Superior Tribunal de Justiça irá elaborar e apresentar perante o Congresso Nacional o aguardado Projeto de Lei que trará plenitude à Emenda Constitucional, utilizando-se do poder de iniciativa que lhe confere a Constituição Federal, em seu artigo 61. Aos causídicos, resta a expectativa de que, mesmo diante da ausência de poder vinculante do Enunciado Administrativo nº 8, os Tribunais de Justiça sigam a orientação institucional da Corte Superior e, ao menos até a publicação da lei regulamentadora, nenhum de seus Recursos Especiais seja inadmitido por falta de demonstração de relevância.

Autor: Maria Carolina De Oliveira Camolesi e Rhenzo Pugliese Abou Haikal

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